Palavra de Nordestino




Tem certas coisas no mundo 
qui se eu pudesse mudava:
gente falsa e fuxiquêra 
s'eu fosse a morte matava;
home qui faz e diz num fiz, 
qui num sustenta o qui diz, 
se eu pudesse inforcava.

Minha palavra é um tiro, 
é iguá um decumento.
Nem chuva de picarete, 
nem tempestade de vento 
faz a palavra eu quebrá 
e pra mode sustentá 
quaisquer barrêra eu infrento.

Mais cumpade Caitano 
uviu um dotô zangado 
dizeno qui a cimente .
de home tinha acabado.

E qui home de palavra 
nunca mais tinha incontrado. 
Meu cumpade disse: -Tem!
O sinhô tá inganado.

E cumeçaro uma teima 
naquela tem mais num tem, 
cumpade disse: - Eu aposto! 
O dotô disse: - Eu também.

Fizera lá uma aposta, 
saíro os dois avechado, 
chegaro na minha casa 
eu já vinha do roçado.

Quando o dotô me avistô 
me disse - Preste atenção 
Vô lhe pidir uma coisa 
me dita se dá ou não!
Aí eu disse. - Dotô 
se eu tiver eu lhe dô 
quaiqué coisa meu patrão.

-Seu dotô, na minha casa 
o sinhô tá arrumado 
pode pidir quaiqué coisa 
e ficá assussegado 
qui si num tivé aqui 
eu vo buscá no roçado.

- Num é nada disso não 
O dotô poi-se a falá 
- É somente uma coisinha, 
mas ói qui você num dá!

Aí eu disse dotô 
pode vim um coroné 
qui eu disse qui dava, dô 
Pode dizê o qui é.

Quando ele disse o qui era, 
eu só fartei istorá, 
qui dotô mais discarado, 
nunca pudi imaginá
Meu sangue todo subiu, 
o qui ele me pidiu 
eu num posso nem falá.


Fiquei morto de veigonha 
o suó chega pingava, 
se eu subesse o qui era 
num tinha dito qui dava.

Mai agora tava tarde, 
pois quando o homem cumeça 
a sustentá a palavra 
ele morre e num regressa.
Dancei qui nem Salomé, 
mai inquanto vida eu tivé 
num caio mai numa dessa.

Eu maginava cumigo.
Meu Jesus tô disgraçado, 
magino é s'eu dé a ele 
e ficá aviciado.

Mai como eu já tinha dado 
a palavra ao disgraçado,

olhei prum canto e pru outro 
e muito disconfiado 
disse assim pru forastêro:
-Vamos pra'quele umbuzêro 
pelo meno é reservado!

Aí foi quando o dotô 
ficô munto admirado
- Home de palavra assim 
eu nunca tinha incontrado.
Não precisa me dá nada 
a aposta tá ganhada, 
seu cumpade é filizardo.

E pagô toda a aposta, 
saiu na hora precisa 
Meu cumpade olhou pra eu 
e cum a cara muito lisa 
asseparou uns cruzêro 
disse: - Pegue esse dinhêro 
pra cumprá uma camisa.

Aí eu disse: -Cumpade 
seu coração é de frande 
Quando fô fazê aposta 
pra outra dessa num me mande,
pois vosmicê me butô 
num pricipiço muito grande.

Quando cumpade saiu 
eu me agarrei cum a mulé 
acendi umas dez vela 
e rezei pra São José.
Hoje em dia eu sô raposa, 
se arguém me pede uma coisa, 
pregunto logo o qui é!


(Poeta Amazan)

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